10 de nov. de 2012

Essa não é uma história de amor

A primeira vez que ouvi falar do filme Ruby Sparks foi dias antes do lançamento no Festival do Rio, quando uma amiga disse no twitter que queria ver "o nascimento de um novo objeto de idolatria hipster". Se você é hipster ou se já viu (500) Dias Com Ela, sabe do que ela estava falando. Aliás, por me lembrar tanto "500" que eu decidi assistír. Agora já faz um mês que eu o vi, e ele sempre volta à minha mente, então pode-se dizer que me marcou de alguma forma. Foi um filme bem divertido, mas o tempo todo fiquei preocupada com um determinado aspecto dele. E me pergunto, então: por que existem Manic Pixie Dream Girls?
MPDG é um estereótipo do cinema, aquela personagem peculiar, excêntrica, complicada, muito feminina e atraente. Nada demais, mas o seu maior problema é que elas não possuem uma história própria e só servem para ajudar no desenvolvimento dos protagonistas, normalmente homens depressivos. A primeira vez que li sobre isso não dei muito crédito, principalmente porque considerava uma das minhas personagens favoritas, Summer de (500) Dias Com Ela, uma MPDG. Negação pura. Com o tempo, apesar de a Summer ter um pequeno desenvolvimento ao longo do filme, tornou-se mais evidente para mim como ela só existia na obra em função do Tom.
Então, quando fiquei sabendo de Ruby Sparks, esse estereótipo também surgiu e fiquei logo desconfiada. À primeira vista, uma das minhas maiores decepções com o filme foi justamente a tal Ruby do título ser a epítome da Manic Pixie Dream Girl. Mas isso realmente não deveria ser uma surpresa, já que ela é fruto da imaginação do protagonista, o escritor Calvin. Então comecei a rever meus conceitos e prestar mais atenção. Ruby é uma espécie de Ultimate MPDG justamente para criticar o estereótipo. 
Há uma cena no filme em que Harry, irmão de Calvin, diz que "As mulheres excêntricas e complicadas cujos problemas fazem delas atraentes não existem". Retomo a minha pergunta: por que, então, elas existem nos filmes (e livros, peças, etc)? Isso acontece no mundo real? Por incrível que pareça, sim, acontece muitas vezes. Mas não na forma de ícone hipster, que escuta The Smiths e gosta de brincar de casinha na Ikea. Aparecem na forma de mulheres comuns, como eu e tantas outras. Isso aconteceu ao longo da história, assim como a personagem também aparece em obras de todas as épocas. Mas antigamente não era voluntário, as mulheres não haviam conquistado sua liberdade e estavam submetidas aos homens. Então, é pior perceber que isso acontece hoje em dia: diferente dos filmes, esse comportamento parte das próprias mulheres e não dos homens que as idealizam.  Elas próprias se rebaixam a uma existência em função do seu parceiro.
Voltando à ficção, muitos críticos afirmam ser um estereótipo machista por rebaixar o personagem da mulher. Eu não penso diferente. Embora o homem precise daquela mulher para transformar sua vida, e pareça tocante essa dependência masculina, a imagem final ainda é machista. O pior: geralmente esse filmes são do tipo fofos e amáveis. As mulheres acabam se encantando como eu me encantei pela Summer. Durante algum tempo, inconscientemente, eu desejei aquilo pra mim. Por isso os homens não acham errado esse idealismo e o confudem com amor verdadeiro. E é por ser, de certa forma, nobre para a mulher, que temos as MPDGs reais que se sujeitam a isso. Estou longe de ser a feminista mais radical, mas culpo a existência desse estereótipo na ficção pela manutenção desse comportamento na vida real.

Nos filmes, normalmente a mulher se "rebela" ao final, como isso fosse suficiente para dar a personagem a sua independência. E apesar de Ruby Sparks ser um crítica a tudo isso, ver mais uma Dream Girl tirou todo o brilho do filme para mim no final das contas, assim como perceber que muitas pessoas não entenderam a mensagem do filme ao fazer uma rápida pesquisa no tumblr. Semanas mais tarde, fui ver As Vantagens de Ser Invisível, quase rezando para que a personagem de Emma Watson não fosse outra MPDG. Acabei feliz por ver como Sam tem mais desenvolvimento pessoal, como ela também se beneficia da relação com Charlie e não existe apenas para o crescimento dele. Gostaria que mais filmes começassem a ser assim. Nada contra mostrar como os homens podem depender de uma mulher para mudar suas vidas, mas elas deveriam deixar de ser objetos dessa transformação e serem personagens com histórias próprias.
Apesar de ainda adorar a Summer, cada vez mais desejo o fim das Manic Pixie Dream Girls. Pelo bem dos relacionamentos das gerações futuras. E porque não aguento mais escrever esse nome.

Nenhum comentário:

Postar um comentário