2 de set. de 2012

Questão de centímetros, digo, princípios.

Uma verdadeira crise existencial tem me perseguido nos últimos meses. Fiquei todo esse tempo diante da dúvida, sem saber o que fazer. Até onde a minha alma feminina me levaria contra a razão e o bom senso? Que poder é esse que a sociedade tanto exerce sobre nós? Pois bem, resolvi me abrir sobre esse problema, talvez haja luz no final do túnel para mim. Talvez, dividindo isso aqui, eu encontre a paz que fez questão de me abandonar desde aquele fatídico dia. O dia em que eu conheci os malditos sneakers com salto.
Não ria. É sério.
Antes que algum querido leitor - talvez o único - resolva fechar essa página e me achar mais uma louca-fashion-victim-consumista-capitalista, prometo que tentarei tirar algum conteúdo relevante disso tudo. Ou não, mas farei com que o relato seja ao menos interessante.
Pra quem não conhece, eis os malditos.
Veja bem, em algum momento do último ano, que não lembro bem pois desisti de acompanhar as semanas de moda, dona Isabel Marant achou que seria bonito inventar um novo tênis paras fashionistas. Um tênis com um salto embutido. Vou confessar, a primeira vez que eu vi, achei uma das coisas mais medonhas que esse mundo já produziu. Não chega a ser tão ruim quanto uma pochete, ou ainda esses novos creepers que todo mundo tá achando bonito só porque a Chanel lançou. Sempre que eu via as celebridades internacionais (incluindo celebridades do streetstyle) usando um, me dava um nó na garganta. Como a mulher não via que parecia que ela estava carregando aquelas tornozeleiras de academia em cada perna? Achei talvez que a idéia até fosse essa, fazer exercício entre o desfile da Dior e da Miu Miu, já que semana de moda exige esse tipo de preparo físico e não sobra tempo nem pra comer. Se bem que elas não fazem questão de comer mesmo.
Só que o capitalismo é uma coisinha infernal. Rapidamente todas as fashionistas brasileiras caíram de amores pelos sneakers e foi uma chuva deles em todos os blogs de moda por aí. E então começaram as versões nacionais. Ou foi o contrário? Bem, a verdade é que eu nem tive tempo de digerir a nova moda antes que Arezzo e Schutz lançassem suas versões "econômicas". Econômicas porque o original deve custar uns 500 euros, porque nunca que 300 reais num tênis vai ser algo econômico. E os homens nem podem reclamar, porque estão aí dando esse valor num Nike que custa 2 dólares pra ser feito. Pelo menos meu pai gasta isso num sapatênis de cour... Er, onde eu estava mesmo? Ah sim, aí chegaram as versões nacionais. E não é que eu achei aceitável?
A culpa só pode ser das tachinhas. Basicamente, coloque tachas, spikes, caveiras ou qualquer outra coisa do gênero numa roupa e eu vou desejá-la imediatamente. Nunca vi pochete com tachas, mas se tivesse provavelmente compraria. Mas na verdade, as novas versões eram com cadarço no lugar daquele fecho de velcro detestável. Isso fez com que os tênis parecessem mais bonitos, sabe? Comecei a gostar. Entrei sem querer querendo numa Arezzo e coloquei o maldito no pé. E não é uma delícia? Nem parece que tem uns 3-5 centímetros de salto ali, super confortável. E comecei a imaginar usando ele para parecer um pouco mais altinha, mas ainda assim confortavelmente. Comecei a pensar em como esses 5 centímetros seriam legais em shows. Já são 5 centímetros a menos de cabeça entre eu e um Julian Casablancas por aí. Mas 350 reais ainda era demais pra mim...
E então veio o BOOM. Sim, o boom, porque agora em qualquer lojinha de sapato, em qualquer esquina, você encontra um. E cada um mais horroroso que o outro. O sapato já era no mínimo duvidoso na versão com velcro, resolveram fazer ele colorido, com glitter, tachas e aberturas! Todo o tipo de maluquice. Embora essas novas versões sejam mais "populares", apesar de ainda custar em torno de 200 reais, elas eram ainda mais feias. E as mulheres insistem em usá-los! Agora, a cada canto, seja zona sul, centro, zona norte, eu encontro uma vítima da Isabel Marant desfilando os seus. Detesto, sempre detestei, sair igual a todo mundo por aí, então sentia um certo alívio em não estar calçando um como metade da população feminina que frequenta o Shopping Leblon.
Mas eles ainda me tentavam. Eu precisava daqueles poucos centímetros pra me firmar novamente nesse mundo. Imaginava já usando-os no Lollapalooza do próximo ano, Superior às outras meninas, tão baixinhas perto de mim e dos meus sneakers. E foi aí que eu vi que a Arezzo relançou a sua versão de cadarço, sem as tachinhas, mas cem reais mais barata. Já tinha colocado R$250 nas minhas contas, porque aquele tênis seria meu. Eu seria feliz de novo. E estaria em paz!
No final, eu recuperei minha razão. Que absurdo de vida é essa que eu vivo para um tênis fazer isso comigo? Sou assim tão consumista mesmo? Essa então, tem que ser minha prova. Direi não a esse maldito tênis. Cinco centímetros não farão qualquer diferença na minha vida, vivi bem até agora sem eles, muito obrigada. Dizer não é como minha própria forma de queimar sutiãs. Estou me libertando, pelo menos em parte, dessas amarras que o capitalismo coloca sobre nós. Não serei mais uma consumidora cega. Não preciso gastar metade da minha mesada com um calçado que no fundo eu nunca quis. Me sinto finalmente em paz, paz verdadeira.
Agora só não posso esquecer de ir buscar minhas sapatilhas de gatinho amanhã. Só R$79, e dona Charlotte Olympia querendo que eu pagasse 600 euros nelas!

3 comentários:

  1. Here I go again depois de um bug que apagou meu comentário.
    Cara, nunca tinha parado para ler um texto seu aqui no blog. Desculpa.
    Que você escreve muito bem gramaticalmente e 'conteudisticamente' falando ninguém duvida, logo esse é mais um texto ótimo que você escreveu.
    Nem é disso que eu vim falar. Cara, FOI OUTRA MARINA QUE ESCREVEU ESSE TEXTO. Esse não é um texto, geralmente os tweets são assim, daqueles que eu e qualquer pessoa consegue imagina seus trejeitos e intonações dizendo aquilo. Vejo outra Marina aqui. Uma Marina mais leve, mais despojada,mais livre, que pela impressão que eu tenho você guarda pra você, de propósito ou não.
    Sério, acho que você deveria explorar muito mais essa 'você' que você põe no texto; deixar que ela aflore mais. : )
    Desculpa eu me meter mas você sabe que eu sou assim '-' .

    Miss you in my mornings ♥
    Beatriz Limeira

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  2. Crônica deliciosa. Parabéns pela escrita!

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  3. "Cara, nunca tinha parado para ler um texto seu aqui no blog. Desculpa." Pra não dizer nunca, eu li o "1, 2, 3, testando..." quando você criou o blog haha
    Ainda bem que resolvi ler. Sempre soube que você escrevia bem, claro, mas este texto ficou realmente incrível. Ainda é fácil de se identificar: que pessoa jamais sentiu o poder invisível desse mundo capitalista nos pressionar até comprarmos uma coisa que nem queríamos para começo de conversa? Só não digo que isso sempre acontece comigo, porque na maioria das vezes não tenho dinheiro para fazê-lo rs. Mas força, Mari! Você não precisa disso! (Preciso aprender a me dizer isso quando paro na frente de uma loja...)

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